Um percurso combinatório: entre o giz e o mouse

As razões que nos aproximam do uso de todos os meios de comunicação é a necessidade de expressão do pensamento. Todos os meios, desde a escrita até o computador, foram criados pela necessidade do homem de se comunicar. Por isso, não se deve reduzir o uso da tecnologia na instituição educacional ao simples uso da técnica — mote central dessa pesquisa. A televisão, o computador e outros aparatos tecnológicos, não podem ser considerados apenas objetos de estudo, mas os meios pelos quais inventamos incursões diversas pelo mundo da palavra e da imagem.
O homem descortinou novos horizontes, explorou territórios desconhecidos, sempre impulsionado pelo desejo de interação, de descoberta. Guiado pelo sonho, ele se insere num verdadeiro redemoinho cultural. A informática é um dos resultados desse sonho, é um ambiente aberto às explorações e ao movimento. É um meio de comunicação que admite a adição de novos elementos a toda hora, num processo dinâmico de composição e recomposição.
Não há, portanto, como negar que o conhecimento pode alcançar níveis mais complexos com a informática, já que a possibilidade de simulação virtual propicia ao indivíduo uma experiência bem diversa daquela oferecida pela leitura, televisão, cinema ou tradição oral. Ela se assemelha às experiências cotidianas práticas, cujas causas e efeitos não só são cogitadas como observadas e sentidas nesse espaço virtual. Tudo passa pela experiência: o conhecimento vem da ação, a simulação é instrumento de construção. Não há somente recepção, como nos casos, por exemplo, do rádio e da televisão, mas o usuário pode interferir imediatamente, reconstruir. Através da simulação, o indivíduo internaliza regras de conduta de seu grupo social que passa a nortear seu desempenho, ou ainda, cria uma resistência acerca destas e procura rompê-las, bem como, é ajudado a superar certas ações impulsivas, aprendendo a planejar soluções.
A aprendizagem sempre esteve calcada no conhecimento por simulação. Desde pequenos, imitamos o comportamento de nossos pais, professores, amigos, ídolos. Busca-se nos livros, na televisão, no cinema a identificação com este ou aquele modelo. A instituição educacional apela também para esse tipo de conhecimento, ao impor a leitura de cânones literários. O que faz a cultura da informática? Amplia, injeta luz, cor, som, movimento nesses estereótipos e lança mão desse conhecimento por simulação, já praticado desde que o homem é homem. A oralidade, a escrita, a impressão foram apreendidos por simulação. O que isto significa? Que é necessário relativizar nossa postura frente a informática, ela é um campo novidativo, sem dúvida, mas cujas bases estão, nos modelos informativos anteriores, inclusive, na tradição oral e na capacidade natural de simular mentalmente os acontecimentos do mundo e antecipar as conseqüências de nossos atos.
Estamos tão acostumados com a escrita que não percebemos que as remissões de um artigo a outro, ou que as notas de rodapé, os sumários, as informações cruzadas, a definição de uma palavra que remete a outra num circuito sem fim, tudo isso apresenta caráter de um hipertexto. "A impressão transformou de maneira radical o dispositivo de comunicação no grupo de letrados. Algumas vezes há toda uma rede internacional de correspondentes e de críticos colaborando em edições sucessivas de certo texto religioso ou de uma obra de geografia". Os jornais e as revistas, inclusive, apresentam esse caráter flutuante do hipertexto, várias matérias são arroladas sem que haja um fio condutor entre elas, e o leitor é livre para seguir a seqüência que quiser (os CD-ROMS se apresentam com estas propriedades). Passamos de uma página para outra, nos alçando em vôos sem roteiro pré-estabelecido, assim como passamos de um link a outro.
O computador torna-se assim, mais um dispositivo técnico — como o vídeo, a televisão... — pelo qual podemos perceber o mundo que nos cerca. Mais uma forma de repensá-lo e de debater o uso da comunicação em geral, mais uma tentativa de inserir a instituição educacional no mundo, tornando-a um espaço vivificante, que prepara o indivíduo para a vida e não prioriza o mero acúmulo de informações.
A informática dá continuidade ao trabalho de acumulação e de conservação realizado pela escrita, entretanto efetua um salto, uma superação. Não é só a exploração das imagens sobre as palavras que fazem dos procedimentos de leitura e produção via computador um universo mais rico e atraente, pois esse caminho já foi trilhado pelas revistas que esbanjam cores e desenhos. Nem tampouco o acesso não linear e seletivo, da segmentação do saber em módulos que oferecem os hipertextos, pois esta é uma prática também utilizada na escrita. A informática ultrapassou os outros meios de comunicação, fundamentalmente pela velocidade com que tudo acontece.
O computador está inserido num processo de comunicação gigante, cada informação transmitida em rede de conversação é um ato de linguagem, e não podemos ignorar aquele que a usa, pois a linguagem expressa o real, ela não só é modelada pelo usuário como este a modela. Ao discorrer sobre a informática, não estamos falando simplesmente de uma máquina inserida numa sociedade abstrata, mas de uma rede humana que opera esta máquina, pessoas que vivem em diversos lugares, épocas, circunstâncias e possuem determinados valores como agentes de seu meio. Uma sociedade que tem um passado. Por isso, discutimos, aqui, questões que dizem respeito não só a uma rede digital, mas a uma rede humana.
Precisamos trabalhar com a interação homem/máquina, da ação do sujeito e do objeto ao mesmo tempo: não podemos colocar "de um lado as coisas e as técnicas e do outro os homens, a linguagem, os símbolos, os valores, a cultura ou o mundo da vida". Antes de tudo, a informática é um modelo aberto que promove diferentes modos de pensar e de se relacionar com as pessoas e com o conhecimento. Um "lugar" expansivo, vivo e conflituoso.

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