POR QUE LER LITERATURA INFANTIL E JUVENIL NA ESCOLA?

Prof. Douglas Tufano

“Mais vale uma cabeça bem feita
que uma cabeça bem cheia”.
Montaigne (1533 –1592)
A lembrança desse pensamento do Montaigne pode me ajudar a sistematizar idéias a respeito da importância da leitura na escola. Se considerarmos que a educação deve estar mais atenta ao desenvolvimento da maneira  de pensar do que à memorização de conteúdos previamente estabelecidos, devemos perceber que a escola teria como uma de suas funções básicas, propiciar ao aluno atividades que desenvolvessem sua capacidade de raciocínio e argumentação, sua sensibilidade para a compreensão das múltiplas facetas da realidade. A escola, portanto, deveria ser, antes de tudo, o espaço para o exercício da liberdade, pois sem a liberdade esse desenvolvimento nunca poderia ocorrer. E se aceitarmos a idéia de que a literatura é uma forma particular de conhecimento da realidade, é uma certa maneira de ver o real, perceberemos que ela pode ajudar enormemente o professor nessa tarefa educacional.
A literatura propicia ao leitor a percepção de diferentes aspectos da realidade. Ela dá forma a experiências que, muitas vezes, são desconcertantes para o leitor, ajudando-o a situar-se no mundo. Essa função enriquecedora da literatura deve ser aproveitada na escola, permitindo que professores e alunos se juntem numa atividade criativa, que abre horizontes e desenvolve o senso crítico. E esse desenvolvimento é um esforço de desalienação do leitor, possibilitando-lhe acercar-se do real e libertar-se de formas estereotipadas de ver o mundo. A boa literatura problematiza o mundo, tornando-o opaco e incitando a reflexão; é um desafio à sensibilidade do leitor, que assim se enriquece a cada leitura. A boa literatura não oferece modelos de comportamento nem receitas de felicidade, mas provoca o leitor, estimulando-o tomar posição diante de certas questões vitais.
Mas essa característica estimuladora da literatura pode ser anulada se, ao entrar em sala de aula, o texto for submetido a uma prática pedagógica que o empobreça, reduzindo sua potencialidade crítica. O professor é o intermediário entre o texto e a criança. Mas como leitor maduro, experiente, cabe ao professor a tarefa delicada de intervir e esconder-se ao mesmo tempo, permitindo que a criança e o texto dialoguem o mais livremente possível. É só através desse diálogo que a ação desalienadora da literatura pode se fazer sentir. O aluno não deve ser intimado a concordar sempre com a interpretação do professor, não deve ter sua leitura totalmente dirigida. Ao contrário, caberia ao professor desencadear o processo de interpretações do texto, estimulando o aluno a elaborar e expressar sua própria leitura, fazendo com que ele assuma sua posição de sujeito do ato de ler. O texto literário não tem uma resposta, não tem um significado que possa ser considerado único e correto. Ele é um campo de possibilidades que desafia a inteligência da cada leitor individualmente. Avaliar a leitura como se ela fosse algo objetivo é trair a natureza da literatura e, o que é mais grave do ponto de vista educacional; é contrariar o princípio que justificou a inclusão da literatura na escola, pois assim fazendo não estaremos dando ao aluno uma educação estética, que por definição, não pode ser homogeneizada, massificada, despersonalizada. Sem a marca do leitor, nenhuma leitura é autêntica.
Por outro lado, esse equívoco que não respeita as experiências pessoais do aluno no ato de ler, acaba acentuando as diferenças culturais que existem entre os alunos de diversos níveis sociais. Os mais bem amparados do ponto de vista familiar e econômico acabam obtendo as melhores notas, enquanto os menos amparados não conseguem os mesmo resultados. A metodologia equivocada acaba por reforçar essas diferenças e desestimular os alunos menos favorecidos, justamente os que mais precisam da escola.
Se queremos que a escola seja libertária e democrática, devemos repensar essa metodologia que, muitas vezes, faz da aula de leitura uma fonte de frustração e desestímulo. A escola deve ajudar o aluno mais fraco a ser um leitor e não estigmatiza-lo reprovando-o, fazendo com que ele se julgue inferior aos demais.
A escola que todos queremos é uma escola democrática, que dá oportunidade de expressão a todos. E essa escola começa em nossa sala de aula, no nosso modo de conviver com os alunos. E o respeito com que gostaríamos de ser tratados como no respeito que demonstramos por nossos alunos. Nessa perspectiva pedagógica acredito que a literatura seja um importante agente de educação. Além de possibilitar a educação estética propriamente dita, ela permite que professores e alunos se encontrem  no texto para uma reflexão sobre a vida, opondo-se assim a um frio autoritarismo pedagógico para converter-se no fogo que descongela as relações em sala de aula, tornando-as mais humanas, estimulando o diálogo, a troca de idéias, a expressão das emoções.

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