Se não tivesse de pagar 25 anos de reclusão, a alegria da paulista
Cynthya Corvello, 40, seria completa. Detenta do Instituto Penal Feminino Auri
Moura Costa, único presídio feminino do Ceará, Cynthya fez o Enem (Exame
Nacional do Ensino Médio) e conseguiu se classificar na primeira chamada do
Sisu (Sistema de Seleção Unificado) para uma vaga em História na UFC
(Universidade Federal do Ceará).
Na sua opinião, foi a sua boa pontuação na redação que fez com que ela
garantisse a aprovação. Ela atingiu a nota de 900 – o máximo é de 1.000 pontos.
Cynthya
Corvello, 40 fez o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) 2011 tirou 900 na
redação, numa escala que vai até 1.000. Na opinião dela, foi essa boa pontuação
que lhe garantiu a aprovação em história na UFC (Universidade Federal do Ceará)
Jarbas Oliveira/UOL
“Na realidade, não imaginava que
fosse conseguir. Não achava que tinha capacidade intelectual”, descreve,
emocionada. Cynthya foi condenada a 25 anos de reclusão, em regime fechado, por
coautoria em duplo homicídio seguido de roubo, ocorrido há quase 20 anos, em
1993. O problema é que ela ficou foragida até 1998, quando resolveu
apresentar-se numa delegacia do Ceará. “Fiquei presa de 1998 a 1999, depois
consegui um semi-aberto até o julgamento, em 2006”. Condenada a 25 anos e
quatro meses, ela pagou, até agora, dois anos e sete meses da pena.
A decisão de se inscrever no Enem veio de um estímulo de umas
professoras dos EJA (Educação de Jovens e Adultos), que dão aula no presídio
feminino. “A Magnólia me estimulou dizendo que a prova era muito mais para
saber se as teorias da sala de aula se aplicam no cotidiano dos alunos”, conta.
No presídio, outras 14 detentas também fizeram o Enem. Seis delas conseguiram
certificação do ensino médio.
Cynthya já havia terminado o Ensino Médio há vários anos, mas assistia,
vez ou outra, às aulas como ouvinte na turma de terceiro ano no presídio. Na
maior parte do tempo, ela se dedica à organização da biblioteca. E é lá que
reserva espaço para seus autores favoritos: Nietzsche, Lya Luft, Kafka. E foi
também no meio dos livros, com sua jornada de 4 horas na biblioteca que ela
conquistou mais de um ano de remição da pena.
Se a presidiária somar os dias de remição de pena que ganhou – a cada
três dias trabalhados, ela fica com um dia a menos na pena – ela teria direito
ao regime semiaberto daqui oito meses. “Vou ter que contar com a boa vontade do
juiz”, disse. O pedido para a liberação para as aulas já foi feito, pela Defensoria
Pública, através do Núcleo para Presos Condenados, que acompanha o caso de
Cynthya. O resultado deve sair antes do começo das aulas.
Inscrição sob escolta
Para conseguir se inscrever na primeira chamada da universidade, Cynthya
precisou contar com a sorte e boa vontade dos funcionários da UFC. Logo que
soube do resultado, pediu que o pai, que mora em São Bernardo do Campo, em São
Paulo, mandasse os documentos necessários, pelos Correios: histórico escolar e
comprovante de segundo grau (o atual ensino médio). O material não chegou em
tempo hábil. Ela teve de se inscrever com cópias.
E, com autorização judicial, chegou “aos 47 minutos do segundo tempo”,
minutos depois do término das matrículas. “Tivemos de ligar e explicar tudo para
eles”, diz, aliviada. Uma escolta de policiais militares acompanhou Cynthya até
o Campus do Pici, da UFC, onde era realizada a matrícula.
A pré-universitária conta que está preparada para um possível
preconceito que possa sentir nas salas de aula da universidade. “É um assunto
complexo. Se eu tiver vergonha da minha situação de presa, não posso querer que
as pessoas me tratem com respeito”, afirma.
Angélica Feitosa Do UOL, em Fortaleza
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